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Foco no ser humano

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O Dia Nacional da Economia Solidária é celebrado anualmente em 15 de dezembro, uma homenagem ao aniversário do ativista ambiental Chico Mendes, que nasceu no Acre em 1944 e foi assassinado por grileiros de terras em 1988. A Lei nº 13.928/19, que instituiu a comemoração, foi proposta pela então senadora Ana Rita Esgário (PT-ES), no projeto de lei nº 8195/14. Em seu artigo 1º, essa lei estabeleceu que o Dia Nacional da Economia Solidária fosse celebrado “pelos empreendimentos econômicos solidários, pela sociedade civil e pelos governos comprometidos com a economia solidária brasileira”. 

Especialista em Economia Solidária na Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Allane Barbosa descreve que a economia solidária tem como princípios basilares autonomia, democracia, fraternidade, igualdade e solidariedade. “É uma forma de trabalho alternativo, criado pelos trabalhadores sob as promessas de uma racionalidade flexível e compatível com os princípios da solidariedade e da democracia. Essa coletivização representa um modelo de inclusão econômica que coloca o trabalhador no centro do processo produtivo.”

A pesquisadora também é mestra em Desenvolvimento Rural e Gestão de Empreendimentos Agroalimentares pelo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural Sustentável e Gestão de Empreendimentos Agroalimentares, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Pará (IFPA). Em sua dissertação de mestrado, ela estudou a agricultura familiar no contexto da agroenergia do dendê no nordeste paraense. “Essa economia reúne diversas formas organizativas, tais como: cooperativas, grupos solidários e associações, particularmente aquelas vinculadas à economia solidária, vêm disseminando cada vez mais possibilidades de sobrevivência das camadas excluídas do mercado formal de trabalho.” 

Trata-se, portanto, de uma resposta de trabalhadores colocados à margem do modelo capitalista em tempos de crise. A economia solidária é um formato produtivo alternativo, formado por empreendimentos coletivos e autogeridos, cuja viabilidade depende das relações de cooperação e ajuda mútua entre os trabalhadores. 

Sem o mesmo padrão hierárquico habitual, nessa variedade os principais desafios consistem em concorrer com megaestruturas já consolidadas no mercado. Nesse sentido, a intervenção do Estado, por meio de políticas públicas de fomento e de geração de emprego e renda, é essencial para o sucesso da economia solidária. O pressuposto é de que cabe ao Governo, em suas diferentes instâncias, incentivar a participação da sociedade civil na geração de bens e serviços por intermédio da organização, cooperação e gestão democrática e solidária. 

O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) participa da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Economia Solidária, que debate o tema na Câmara Federal. Ele destaca o papel preponderante do público feminino no segmento. “Mulheres são a vanguarda dessa prática que dá espaço, principalmente, aos mais excluídos do capitalismo. A essência dessa economia é a democracia, na qual prevalece a produção e a renda coletiva”, conceitua. 

PEC da Economia Solidária

Desde 2019, tramita no Congresso Nacional a PEC 69, que pretende acrescentar o inciso X ao artigo 170 da Constituição Federal, para incluir a economia solidária entre os princípios da ordem econômica. Proposto pelo senador Jaques Wagner (PT-BA), o texto foi aprovado no Senado e enviado à Câmara Federal, onde encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). 

O autor da PEC avalia que a economia solidária ainda é incipiente no País, mas que tem muito potencial para expansão. “A inclusão da economia solidária entre os princípios da ordem econômica possibilitará que políticas públicas baseadas nesse princípio jurídico moldem a realidade, a ordem econômica real”, prevê o propositor. 

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Para Wagner, portanto, o efeito da PEC não seria apenas simbólico, mas teria desdobramentos sobre o fomento governamental oferecido a essas iniciativas de trabalho. “A economia solidária poderá ser parte ainda mais relevante da economia brasileira, estimulando a produção, o consumo e a distribuição de riqueza, com foco na valorização do ser humano”, conclui na justificativa do projeto. 

Propostas aprovadas na Alego

Antes mesmo da instituição da data nacional, o assunto já era debatido na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego). Em 2017, o então deputado Humberto Aidar apresentou o projeto de lei n° 2210/17. O texto, que foi aprovado (Lei nº 20.273/18), instituiu a Semana Estadual da Economia Solidária, a ser realizada no início da segunda quinzena de dezembro. 

No artigo 4°, o referido dispositivo legal autoriza a realização de parcerias com entidades públicas e privadas, voltadas ao “desenvolvimento de oportunidades para os trabalhadores se organizarem através de empreendimentos solidários, visando a geração de trabalho e renda, com inclusão social, com o apoio do Conselho Estadual de Economia Solidária (CEES)”. 

Na justificativa da propositura, Aidar exemplificou os tipos de empreendimentos que pretendia impactar com a medida: “Envolve diversos tipos de organização coletiva, a exemplo de empresas autogestionárias ou recuperadas (assumidas por trabalhadores); associações comunitárias de produção; redes de produção, comercialização e consumo; grupos informais produtivos de segmentos específicos (mulheres, jovens, etc.); clubes de troca, etc”. 

Com o projeto n° 1583/16, a Governadoria propôs a instituição e estruturação do Conselho Estadual de Economia Solidária (CEES). A proposta do Governo foi debatida na Casa e aprovada em julho de 2016. A matéria justifica o emprego de recursos públicos na economia solidária e ressalta os benefícios dessa iniciativa para o desenvolvimento regional. “O fomento aos empreendimentos solidários permite a inserção no mundo dos pequenos negócios de pessoas que se encontram no mercado informal, com a vantagem de respeitar a vocação de cada região e favorecer o associativismo e a cooperação na busca da produção de novos produtos e serviços que fortaleçam a economia local”, explica a proposta. 

Na atual legislatura, o deputado Zé Carapô (Pros) apresentou o projeto nº 2874/19, que já foi aprovado e sancionado pelo governador Ronaldo Caiado (UB). A proposta criou a Política Estadual do Programa Emancipar (Lei nº 20.553/19), destinada a Empreendimentos Familiares da Agricultura Familiar e Economia Solidária de Goiás. 

Nos objetivos do diploma legal está elencado o fortalecimento do cooperativismo e do associativismo. “A construção de uma rede integrada de geração de oportunidades de trabalho e renda, na perspectiva de um estado emancipador, com perfil de integração das suas políticas públicas inerentes às ações de governo e ofertadas aos cidadãos”, detalha o parlamentar. 

Entre as vantagens previstas na lei encontra-se a concessão de linhas de crédito voltadas para o Programa Emancipar, através da Secretaria de Estado de Indústria, Comércio e Serviços (SIC) e o acompanhamento domiciliar para fins de organização e planejamento produtivo no período de 24 meses. “Para viabilizar as ações do Programa Emancipar, a SIC coordenará o credenciamento de Organizações não governamentais, exclusivamente pessoas jurídicas, existentes no segmento da agricultura familiar e economia solidária, preferencialmente cooperativas e associações comunitárias”, delimita o texto aprovado.

Em tramitação

Atualmente, outras propostas legislativas que beneficiam a economia solidária estão em debate no Legislativo goiano. Em primeira fase de discussão e votação, o projeto n° 2704/20, da deputada Lêda Borges (PSDB), visa instituir o Programa Estadual de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PEAAF). “O presente projeto de lei lança bases importantes de fomento à economia local, propiciando condições de estímulo para a produção de alimentos oriundos da agricultura familiar com sua posterior aquisição, inclusive pelos órgãos e entidades da Administração Pública Estadual, o que certamente ainda acarretará a diminuição das despesas governamentais com a aquisição de produtos similares.”

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O objetivo da proposta é garantir a aquisição, direta e indireta, de produtos agropecuários, extrativistas e resultantes da atividade pesqueira, in natura e beneficiados, produzidos por agricultores familiares, pescadores artesanais, povos e comunidades tradicionais e pelos beneficiários da reforma agrária, ou suas organizações econômicas e sociais, que se enquadrem nas disposições da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006.

A aquisição de alimentos da agricultura familiar em Goiás, por meio PEAAF, será integrada e articulada às políticas e programas governamentais que visam assegurar o direito humano à alimentação adequada, tendo como referência marcos regulatórios, como a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional, o Programa de Aquisição de Alimentos, o Programa Nacional de Alimentação Escolar e a Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais.

A proposta nº 4718/19, também de Lêda Borges, visa garantir igualdade de condições para a participação das cooperativas em licitações e contratações públicas no Estado de Goiás. Na justificativa do projeto, que está em primeira fase de apreciação, a parlamentar destaca que o parágrafo 2º do art. 174 da Constituição Federal de 1988 dispõe que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo. No entanto, segundo a deputada, o princípio da isonomia não está sendo observado pelo Poder Público. “Quando da participação em certames Iicitatórios, ocorre uma discriminação odiosa, impondo às cooperativas condições e exigências diferenciadas de apresentação de documentos não exigidos para as demais empresas comerciais participantes.”

Já o projeto nº 1251/20, do deputado Chico KGL (UB), estabelece critérios para inexigibilidade de licenciamento ambiental para associações e cooperativas de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. A propositura ressalta a relevância desse tipo de organização. “Socialmente, a reciclagem tornou-se uma importante ferramenta de inclusão social uma vez que toda uma cadeia produtiva é fomentada, sendo essa uma fonte de geração de emprego e renda para muitas pessoas e famílias”, comenta o parlamentar. O projeto encontra-se na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ). 

Na prática

Um exemplo de empreendimento que tem dado certo nesse formato é o Instituto Rede Solidária Berço das Águas (IRSBA), com sede no Parque Amazônia, em Goiânia. A organização reúne cerca de 50 iniciativas de economia solidária, em 25 cidades de Goiás. Uma delas, a Bombons do Cerrado, organiza cursos, produção e comercialização de bombons feitos com recheios bem conhecidos dos goianos, como cagaita, baru e cajá-manga.  

O instituto também agrega a Associação de Pequenas Produtoras da Agricultura Familiar (APPAFT). Na agrovila Valdemarzim, situada no município de Trombas, elas produzem coletivamente mandioca, abóbora, milho, amendoim, pimenta, temperos, doces e artesanatos, além de manter uma horta orgânica. 

Para a presidente do IRSBA, Maria Odília Rogado, o trabalho do instituto envolve necessariamente a formação continuada. “Precisamos dessa formação para geração de emprego e renda e para o desenvolvimento dos empreendimentos da rede de economia solidária. Para nós, essa é a economia do bem viver, da cooperação e do respeito à natureza”, sintetiza Maria Odília. 

Fonte: Assembleia Legislativa de GO

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