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Protagonismo delas

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Para discutir a importância do papel da mulher e o combate às desigualdades no ambiente empreendedor, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu, em 2014, o Dia Mundial do Empreendedorismo Feminino, celebrado, a partir de então, no dia 19 de novembro.

Um levantamento do Banco Mundial realizado no ano passado colocou o Brasil em 124º lugar no ranking dos países com melhor ambiente de negócios. O relatório levou em conta aspectos como a abertura de empresas, obtenção de alvarás de construção, registro de propriedade, pagamento de impostos e execução de contratos e, concluiu que a burocracia no Brasil é um grande entrave para a abertura e avanço das empresas.

Junto a isso, a alta e complexa carga tributária e os gargalos logísticos e, o resultado é um cenário pouco favorável para quem quer ou já está empreendendo.

Quando quem se propõe a empreender é uma mulher, a situação é ainda mais delicada. Segundo dados do Relatório Especial de Empreendedorismo Feminino no Brasil, divulgado pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) em 2019, as donas de negócios têm um nível de escolaridade 16% superior ao dos homens, mas apesar de mais qualificadas, as mulheres empreendedoras ganham cerca de 22% a menos que os homens.

Já o estudo Perfil Mulher Empreendedora, realizado pelo Sebrae Goiás, em março desse ano, com base nas estimativas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) de 2020, as mulheres empreendedoras já são maioria no estado de Goiás: são cerca de 3.682.457 mulheres, que correspondem a 51,50%, contra 3.467.147 homens empreendedores, 48,50%.

Mesmo sendo maioria, o estudo constatou que há uma diferença de renda média entre mulheres e homens. Enquanto as mulheres empreendedoras, classificadas na categoria empregadoras, têm em média uma renda de R$ 4,3 mil, os homens empregadores têm, em média, renda de R$ 5,9 mil.

Desafios enfrentados

Para a analista do Sebrae Goiás Vera Elias de Oliveira, mesmo com todas as adversidades, as conquistas femininas frente ao empreendedorismo vêm acontecendo, especialmente, nos últimos quarenta anos, em que houve, uma taxa de inserção das mulheres na gestão de negócios acima de 10%, a cada década.

Para a analista, o bom desempenho das mulheres, a despeito do enfrentamento a todos esses desafios, por si só, é um bom motivo para se comemorar a data. “As exigências à sua entrada no mercado são colossais: elas enfrentam preconceitos enraizados, a pressão do relógio biológico, a sobrecarga dos cuidados com os filhos versus uma jornada intensa de trabalho, que depois da pandemia chegou a levar esta jornada a ser contínua. A inserção em segmentos econômicos de maior valor agregado como tecnologia e engenharias, ainda tem muitas barreiras para as mulheres, especialmente, mães, ocuparem espaços. Mas evidenciar e valorizar as mulheres que têm sido protagonistas na gestão empresarial é uma forma de estimular outras mulheres a empreender”, analisa.

Ela reconhece, no entanto, que ainda há um caminho muito longo a ser percorrido para que as mulheres participem, em condições de igualdade, com os homens, no mundo empresarial. Segundo Vera Elias, atento a essas demandas, o Sebrae desenvolveu um produto específico de incentivo e capacitação do público empreendedor feminino, o Sebrae DELAS (Desenvolvendo Empreendedoras Líderes Apaixonadas pelo Sucesso).

Segundo a analista, a intenção é proporcionar às empreendedoras, a capacidade de gerar negócios sustentáveis. Para isso, disponibiliza capacitação, consultorias, mentorias, eventos, rodas de conversas, dentre outras ações com o propósito de dar suporte às mulheres no processo de estimular o desenvolvimento pessoal, dos negócios e no fomento da rede de atores que apoiam as empreendedoras, criando um ambiente favorável aos negócios.

As soluções foram desenvolvidas porque quando uma mulher empreende, ela gera emprego e renda, além de encorajar a participação de outras mulheres nos negócios. O Sebrae, com a força que move a empreendedora brasileira, atua nas mais diversas frentes para consolidar esta rede, fomentando a cultura empreendedora, sendo apoiador, consultor, facilitador para que mulheres que empreendem ou querem empreender tenha sucesso em seus negócios. Os produtos estão todos disponíveis, o ambiente digital, na página https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/empreendedorismofeminino/”, diz Vera Elias.

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Empreendedoras negras

A trajetória empresarial da chef Elaine Moura é impressionante. Filha de um eletricista semianalfabeto e de uma dona de casa, que ela define como “uma mulher preta, mas cheia de sabedoria”, ela começou a trabalhar cedo. Aos 12 anos, Elaine, que é neta de cozinheiros, começou a fazer doces e artesanato para ajudar no orçamento doméstico.

Três anos depois, ela teve seu primeiro e único emprego formal, como secretária numa empresa de eventos. Repetindo a história de muitas meninas na mesma situação, enfrentou todo tipo de preconceito social, racial e moral, dificuldades que ajudaram a moldar sua personalidade. “Isso me fez uma mulher muito forte. Fui mãe aos 24 anos. Estudei economia, me formei em jornalismo e gastronomia e, em seguida, tive um dos melhores bufês de Goiânia, por 19 anos”, relata.

Elaine já tinha comprovado sua competência profissional como chef e como empresária, mas buscando uma receita de sobremesa autoral, mal sabia ela que daria uma guinada como empreendedora. “Eu adoro pipocas e desenvolvi uma receita incrível e única de uma pipoca muito gostosa e diferente. Eram pipocas caramelizadas, cobertas com chocolate e aveludadas com leite ninho ou algum outro sabor como cookie, paçoca com especiarias, caramelo com flor de sal. Simplesmente irresistíveis. Logo, os primeiros feedbacks dos clientes que recebiam esse doce de presente, eram muito positivos. Eles pediram para comprar nossas pipocas. Deu muito certo”, relembra.

No ano seguinte, Elaine foi convidada para ser chef da Casa Cor e viu no evento a grande oportunidade de lançar a marca PopCorn Gourmet como grife. Foi o impulso que precisava para posicionar o produto. Fechou negócio com compradores de peso como um resort e um grande shopping do país. A partir daí o negócio cresceu e se expandiu.

A PopCorn Gourmet aumentou o mix, além de 15 sabores de pipocas, outros produtos foram lançados, como cappuccinos, frapês, panetones e placas de chocolate. Tudo com pipoca, claro. Logo em seguida, a empresa também abriu as primeiras franquias e diversificou canais passando a vender para grandes redes de supermercados e em Marketplaces. A empresa também firmou parcerias com grandes marcas para produção de sabores de pipoca, como a Nestlé.

Mas, infelizmente, o exemplo vitorioso de Elaine é uma exceção. As adversidades enfrentadas pelas empreendedoras, são ainda maiores para as mulheres pretas. Os números comprovam. Segundo o Perfil Mulher Empreendedora, em Goiás, apenas 3,2% das mulheres empresárias empregadoras, são pretas e 7,2% são trabalhadoras por conta própria (que empreendem, mas não geram emprego).

E a proprietária da PopCorn Gourmet sabe bem o que são as dificuldades de empreender para quem tem a pele negra. Mesmo sendo uma empreendedora de muito sucesso, com a empresa faturando milhões e com uma fábrica fora do Brasil, por várias vezes, Elaine foi vítima de preconceito. “A dificuldade para captar investimentos é a prova viva do quanto é mais complicado para a mulher negra. Eu já estive a frente de grandes negociações e, quando cheguei presencialmente, uma desculpa frágil foi dada para não dar sequência na negociação”, relata.

De acordo com a analista do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, a instituição também tem focado em ações que contemplem as empreendedoras pretas. Ela lista que uma das iniciativas é o conhecimento da realidade, através de uma parceria feita com a Universidade Federal de Goiás para o levantamento de dados, apresentados no Perfil Mulher Empreendedora Goiana. Ela garante que com os números em mãos, o Sebrae ajusta a atuação, no sentido de atender as demandas específicas, além de sensibilizar os atores políticos e sociais para estimular o afroempreendedorismo no estado.

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O Sebrae Goiás tem atuado junto a grupos organizados, dando as mulheres pretas o seu apoio tanto na formalização, desenvolvimento e no acesso à oportunidade de mercado para esta mulher negra que, muitas vezes só tem meios de sair da situação de vulnerabilidade, através do empreendedorismo”, assinala.

Como empreendedora que sofreu o preconceito por causa de sua cor, Elaine agora também atua para ajudar outras mulheres na mesma situação. “Hoje tenho mais conforto financeiro e busco entidades que têm o olhar voltado para inclusão racial e de gênero. Participo de alguns grupos de afroempreendedores que se ajudam mutuamente todos os dias”, explica.

Incentivo

Para apoiar mulheres como Elaine, a Assembleia Legislativa aprovou um projeto que instituiu a Política Estadual de Estimulo ao Empreendedorismo Feminino. De autoria dos deputados Wagner Camargo Neto (PRTB) e Virmondes Cruvinel (UB), a lei foi sancionada pelo governador Ronaldo Caiado (UB), no último mês de julho.

Entre os princípios da nova legislação, está a capacitação e formação das mulheres, a fim de torná–las empreendedoras, a promoção do acesso das mulheres empreendedoras ao crédito e, ainda, a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade, com o fim específico de estimular as iniciativas das mulheres que empreendem ou buscam empreender.

Na justificativa do então projeto de lei, os parlamentares lembram que no mercado de trabalho, as mulheres enfrentam dificuldades como o desemprego, já que o público feminino corresponde a 56,9% das pessoas sem trabalho do país. Além disso as mulheres cerca de 73,5% dos salários dos homens. Dados trazidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2016.

Eles citam ainda levantamentos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que mostram que serão necessários 87 anos para igualar os salários de homens e mulheres no Brasil, se não houver investimentos em políticas de redução de desigualdades. “Isso acontece mesmo elas tendo maior tempo de estudo do que os homens. O empreendedorismo é uma maneira de diminuir a desigualdade. Diante de tantos desafios, as mulheres empreendedoras merecem uma política de incentivo profissional diante de sua extrema importância para a sociedade”, justificam.

Leis como essa podem fazer a diferença para mulheres que partem para o empreendedorismo por falta de opção ou que buscam a independência financeira ou simplesmente, uma melhor qualidade de vida.

A jornalista Suely de Oliveira é uma dessas mulheres. Em 2017, ela deixou a empresa na qual trabalhou por cerca de 20 anos, para conquistar a independência pessoal. Ela conta que tomou a decisão, principalmente, por causa da falta de tempo para cuidar dela mesma e da família. “O trabalho era muito puxado. Eu precisava fazer muitos sacrifícios, por muitas vezes tive que renunciar ao meu papel de mãe, por causa do serviço. Então por esse trabalho consumir todo meu tempo, eu decidi empreender”, relata.

Experiente na área, ela montou uma pequena produtora de vídeos e passou, ela mesma a gerenciar sua vida profissional. Mas com a jornalista também não foi diferente. Na trajetória como empreendedora, enfrentou (e enfrenta ainda) muitas dificuldades. A empresa está crescendo, ela está feliz, mas poderia estar melhor, se houvesse mais incentivos. “Eu tenho certeza que é mais difícil para as mulheres, há uma competição desigual no mercado. Nós temos capacidade e competência para saber lidar com essa situação, mas nós temos que desempenhar o papel de mãe, de esposa, temos que nos desdobrar. Penso que poderia ter mais incentivos, até financeiros, para conquistarmos nosso espaço, para que, especialmente as mães, pudessem empreender mais”, finaliza.

Fonte: Assembleia Legislativa de GO

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