Nacional
Nordeste concentra quase metade dos ônibus fiscalizados no 2º turno
A Controladoria-Geral da União (CGU) retirou o sigilo, e os dados divulgados sobre a atuação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia 30 de outubro do ano passado, data do segundo turno das eleições, mostram concentração “atípica” de operações na Região Nordeste. De acordo com uma tabela apresentada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, 324 ônibus foram paralisados em estradas no Nordeste, o que representa cerca de 46% do total de veículos abordados em todo o país, 696. As demais regiões, juntas, tiveram 372 veículos parados.
“Temos agora a comprovação empírica, que nasce da própria Polícia Rodoviária Federal, no sentido de que houve um desvio de padrão, em relação à atuação rotineira, ordinária da PRF”, afirmou Dino durante coletiva de imprensa para apresentar os dados, na tarde desta quinta-feira (20), em Brasília. A revelação dos dados foi uma decisão da CGU a partir da análise de um recurso feito ao órgão com base na Lei de Acesso à Informação (LAI).
Segundo o ministro, a operação da PRF no segundo turno das eleições superou até mesmo as fiscalizações que ocorrem anualmente durante o período de festas juninas no Nordeste, o São João nordestino, que até então era a maior operação executada pela PRF na região, em eventos que duram cerca de um mês.
Os dados mostram também que 48 ônibus foram retidos em estados do Nordeste entre os dias 28 e 30 de outubro de 2022, praticamente o dobro dos 26 ônibus que ficaram retidos em todas as outras regiões do país somadas, ao longo do mesmo período.
Os pontos fixos de fiscalização foram bem superiores no Nordeste (290), enquanto uma região bem mais populosa, como Sudeste, registrou 191 pontos, seguida das regiões Sul (181), Centro-Oeste (153) e Norte (96).
O efetivo de agentes que atuaram no segundo turno das eleições de 2022 também foi maior no Nordeste (795), seguido pelas regiões Sudeste (528), Sul (418), Centro-Oeste (381) e Norte (230). Além disso, foi empregado um valor total de quase R$ 1 milhão para o pagamento de horas extras para que agentes em folga fossem convocados para atuar no dia da eleição. O valor é bem superior aos cerca de R$ 685 mil usados para “comprar” a folga de agentes no Sudeste, por exemplo.
Suspeitas
Na época, a intensidade da fiscalização na Região Nordeste chamou a atenção de eleitores e mobilizou autoridades no país. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, chegou a proibir a PRF de realizar qualquer operação que afetasse o transporte público de eleitores. O objetivo era impedir que a PRF fosse mobilizada em favor da campanha à reeleição do então do presidente Jair Bolsonaro e em desfavor da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva. O petista acabou saindo vitorioso do pleito.
A Polícia Federal investiga uma viagem do então ministro da Justiça, Anderson Torres, na véspera do segundo turno. A viagem à Bahia, na época, foi justificada para reforçar a atuação de policiais federais no combate a crimes eleitorais, como compra de votos. No entanto, há suspeita de que Torres tenha viajado para pressionar a PF a barrar eleitores na região onde Lula tinha mais votos. Torres atualmente está preso preventivamente por suspeita de envolvimento na preparação dos atos golpistas do dia 8 de janeiro.
Direcionamento
Outra “anomalia” na atuação da PRF nas eleições do ano passado, como classificou o ministro da Justiça, tem a ver com a duplicação do orçamento que estava previsto para os dois turnos. Flávio Dino explicou que o primeiro plano eleitoral, que abrangia tanto o primeiro quanto segundo turno, era de cerca de R$ 3,6 milhões. Ao término da primeira etapa eleitoral, no entanto, esse plano operacional inicial foi substituído por outro, com previsão orçamentária de mais de R$ 3,5 milhões, uma eleição bem menor, já que não abrangia mais a escolha de parlamentares e de boa parte dos governadores, já eleitos em primeiro turno.
Para o diretor executivo da PRF, Antônio Jorge de Azevedo Barbosa, ficou claro que houve uma atuação direcionada na corporação neste período. “Chegou a haver mais de uma intervenção para esse planejamento e houve um direcionamento para o Nordeste. Depois, foi corrigido para Minas Gerais, mas deixava claro que havia um interesse que não era o interesse rotineiro das ações que a PRF já participou”, afirmou.
O diretor-geral da PRF na época das ações, Silvinei Vasques, é alvo de ao menos um processo administrativo na CGU. Atualmente, o ex-diretor está aposentado da corporação.
“Nós temos aberto um procedimento para investigar as condutas do diretor-geral, isto está em apuração na CGU. Diz respeito a um conjunto de atuações que estão sendo analisadas no agregado, provavelmente”, informou o ministro da CGU, Vinícius Marques de Carvalho. Outro processo administrativo na própria PRF, que havia sido arquivado indevidamente pelo então corregedor-geral da corporação, Wendel Benevides, teve sua investigação retomada. Entre as punições previstas, está a cassação da aposentadoria de Vasques.
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