Política
Iniciativas de deputados objetivam a ampliação da matriz energética, visando fontes de menor impacto ambiental
O Dia Mundial da Energia é comemorado em 29 de maio. Instituída em 1981 para alertar sobre a necessidade do uso racional das energias e da busca por fontes mais sustentáveis de geração, a data se torna cada vez mais relevante, especialmente nesse momento em que o mundo precisa reduzir demasiadamente a emissão de gases que causam o efeito estufa, sendo o principal deles, o dióxido de carbono (CO2). Iniciativas de deputados do Legislativo goiano visam contribuir com a ampliação da matriz energética para a geração a partir de fontes de menor impacto ambiental.
Não é de hoje que cientistas e ambientalistas têm chamado a atenção para os desequilíbrios climáticos, causados pelo superaquecimento do planeta. Isso se dá em função da liberação excessiva dos gases que causam o efeito estufa, um fenômeno, que em escala normal, é essencial para a manutenção da vida na Terra. Isso porque ele é formado por uma camada de gases, como o gás carbônico, metano e óxido nitroso, que cobre a superfície do Planeta e o mantém na temperatura ideal para a sobrevivência das espécies terrestres.
O problema é que, desde a Revolução Industrial, as emissões de gases de efeito estufa (GEE), em especial o dióxido de carbono, foram aumentando, o que intensificou significativamente o efeito e, em consequência, o superaquecimento terrestre.
O consumo de energia é de longe a maior causa de emissões de gases de efeito estufa provocada por seres humanos, responsável por 73% das emissões mundiais. O setor de energia inclui transporte, eletricidade e geração de calor, edifícios, fabricação e construção, emissões fugitivas e outras queimas de combustível.
Como forma de diminuir o impacto da geração de energia elétrica na natureza, a deputada Delegada Adriana Accorsi (PT) apresentou um projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a criar o “Programa Energias Alternativas (PEA)”. A iniciativa é destinada à implantação de modalidades energéticas sustentáveis em habitações de interesse social.
A matéria prevê que o PEA seja implementado nos condomínios de habitações de interesse social, que são voltados para as populações de baixa renda. O programa consiste na elaboração de projetos, na aquisição, instalação e assistência técnica preventiva e corretiva de equipamentos de geração de energia alternativa nesses locais.
Para a autora da proposta, as chamadas energias alternativas são responsáveis por realizar uma geração elétrica de baixo impacto ambiental. Além disso, a Constituição Federal assegura que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Adriana Accorsi finaliza a justificativa afirmando que “a utilização das formas alternativas de energia pode ser uma solução para amenizar a situação de diversas famílias com baixo poder aquisitivo, sem agredir o meio ambiente”.
Outro projeto que visa reduzir a emissão de gases nocivos ao efeito estufa e à ampliação da matriz energética em Goiás é de autoria do deputado Virmondes Cruvinel (UB); ele propõe que seja instituída a Política Estadual do Hidrogênio Verde. A propositura visa o estímulo ao uso do chamado hidrogênio verde, uma tecnologia de geração do gás, que é um combustível universal, leve e muito reativo, por meio da eletrólise. O método utiliza a corrente elétrica para separar o hidrogênio do oxigênio que existe na água. Para a utilização, células combustíveis fazem o processo inverso: o hidrogênio é misturado com oxigênio, produzindo eletricidade e vapor d’água como único resíduo. Dessa maneira não há emissão de dióxido de carbono na atmosfera.
Essa forma de obtenção do hidrogênio evitaria a emissão de 830 milhões de toneladas anuais de CO2 que se originam quando este gás é produzido por combustíveis fósseis, a partir do gás natural ou carvão, o chamado hidrogênio cinza. E essa é uma das justificativas do parlamentar na matéria apresentada.
O deputado ainda sugere que, em Goiás, por conta do alto potencial de produção de energia a partir de outras fontes renováveis, o hidrogênio verde pode ser usado com outros fins, como nas indústrias do etanol e siderúrgica, por exemplo, com balanço negativo de carbono.
Um outro argumento de Cruvinel é a utilização da tecnologia para auxiliar o Brasil no aumento da produção de fertilizantes, já que, atualmente, o que o País produz é insuficiente para atender à demanda. “Quando se retira hidrogênio do gás natural para se produzir fertilizantes nitrogenados (amônia e ureia), produz-se grande quantidade de gás carbônico, que é lançado ao meio ambiente. Nesse contexto, uma vez que o gás natural seja substituído pela água como insumo, o resultado seria uma relevante redução de emissões de carbono, o que é ambientalmente desejável”, diz a justificativa da proposição.
Mudança urgente
Para a fundadora e CEO da consultoria Synergia (uma organização criada com o objetivo de fornecer serviços relacionados à sustentabilidade socioambiental), Maria Albuquerque, a reflexão proposta pela data é mais que necessária. Ela acredita que as matrizes energéticas precisam mudar de maneira urgente, já que a utilização de fontes não renováveis, como o petróleo e o carvão mineral, soma prejuízos incalculáveis como a poluição do ar, do solo e da água, chuva ácida, e principalmente, o aumento da emissão dos gases que causam o efeito estufa.
Maria Albuquerque lamenta a fragilidade das iniciativas nesse sentido. Ela lembra que o Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), ao estabelecer entre os seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um voltado a “garantir o acesso de todos à habitação segura, adequada e a preço acessível, e aos serviços básicos e urbanizar as favelas”, e outro, que visa a “tomada de medidas urgentes para combater as mudanças climáticas e seus impactos” , integrou os 193 países signatários em metas e estratégias comuns para o combate às emissões, porém, passados sete anos da assinatura do documento, pouco foi feito. “O desabastecimento de carvão pela Rússia causado pelo contexto da guerra, por exemplo, tem levado os países europeus e ampliarem o consumo de carvão para a produção de energia. O que se percebe é que as formas de redução são conhecidas, mas passam por mudanças com grandes impactos econômicos, que acontecem muito mais devagar do que o avanço da crise climática”, comenta.
A CEO da consultoria Synergia cita outros dados que demonstram que a redução dos impactos das atividades humanas no meio ambiente ainda está dando os primeiros passos. O Plano Nacional de Energia, feito pelo Ministério das Minas e Energia, por exemplo, prevê que a produção de petróleo deve subir 60% e, a de gás natural, 110% até 2030. Ela lembra também da atividade pecuária, que, segundo o Observatório do Clima, responde por 69% % das emissões de gases, sendo que sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) cresceu, entre 2019 e 2020, de 8,4% para 10%.
A consultora acredita que essa mudança precisa do engajamento de toda a sociedade: “O papel dos governos, regulando os processos poluentes e garantindo a sua redução, é fundamental. A pressão da sociedade também é importantíssima, pois o consumo consciente é a principal forma de redução de processos de produção poluentes, por falta de demanda. E, finalmente, o posicionamento das empresas, especialmente as grandes corporações do agronegócio, mineração, indústria têxtil e alimentícia, exigindo que toda a sua cadeia produtiva seja mantida sem agressões ambientais, criará uma nova cultura de produção, sustentável”, analisa.
Potencial pouco explorado
Com alta incidência de luz solar praticante o ano todo e ocorrência de ventos capazes de gerar muitos megawatts, o Brasil pode liderar essa revolução energética tão necessária, que pode significar a continuidade da vida no nosso Planeta.
Maria Albuquerque cita que, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Brasil recebe mais de 2.200 horas de irradiação solar por ano, quantidade suficiente para gerar 15 trilhões de megawatts de energia. Já os dados da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) mostram que a potência onshore de geração de energia eólica no Brasil é de cerca de 800 GW, ou seja, 4,5 vezes a potência instalada no País, somando todas as fontes: “Ou seja, nosso potencial é praticamente inesgotável”, afirma.
A boa notícia é que a utilização desse potencial vem crescendo ano a ano. Em 2021, o Brasil bateu recorde de expansão da capacidade instalada de energia elétrica a partir de fonte eólica. As usinas de geração a partir do vento já respondem por 11% da matriz energética brasileira e constituem cerca de 20 gigawatts de potência instalada.
Essa expansão fez o País subir no ranking do Global Wind Energy Council (GWEC) e ocupar a sexta posição em Capacidade Total Instalada de Energia Eólica Onshore, em 2021. O relatório do órgão, divulgado no último mês de abril, destaca que o Brasil saltou de 1 gigawatts de potência instalada em 2011 para 21 gigawatts em janeiro de 2022. O líder do ranking é a China, com 310,6 gigawatts de potência instalada. A energia eólica é a segunda maior fonte de geração de energia do Brasil, atrás apenas da hidráulica.
Com relação à energia solar, dados divulgados pela Agência Internacional de Energias Renováveis (Irena) e pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), demonstraram que o crescimento dos projetos, seja nos telhados ou nas usinas de grande porte, garantiu ao País a quarta colocação no ranking mundial das nações que mais acrescentaram a fonte fotovoltaica na matriz elétrica no último ano.
O País acrescentou, em 2021, cerca de 5,7 gigawatts (GW) da fonte solar na geração própria de energia em residências e empresas e nos grandes empreendimentos conectados ao Sistema Interligado Nacional (SIN). O ranking do crescimento da energia solar no último ano é liderado pela China, que injetou 52,9 GW, seguida pelos Estados Unidos, com acréscimo de 19,9 GW, e Índia, com 10,3 GW adicionados.
A consultora ambiental acredita que esse crescimento poderia ser ainda mais acelerado, se não fossem alguns entraves: “A energia hidrelétrica ainda é priorizada no País, apesar da crise hídrica que já está permanentemente instalada na região Sudeste. Os processos de licenciamento no Brasil ainda são lentos, os estudos ambientais são complexos. Ainda assim, o uso de energia solar cresceu 212% em 2019 e 67% em 2021. A energia eólica já representa 11,11% da energia produzida no País”.
Para Maria Albuquerque, algumas medidas simples implementadas pelos gestores públicos poderiam estimular a geração de energia complementar. A exemplo, ela cita as seguintes: a concessão de incentivos fiscais; o estímulo da geração, com campanhas apropriadas aos autoprodutores de energia a migrarem suas fontes atuais, poluentes, para energias renováveis; a realização de estudos e planos específicos de potencial de geração solar e eólico; e, principalmente, a utilização de estruturas sustentáveis de geração de energia limpa em seus projetos e obras.
A especialista acredita, ainda, que cada um pode fazer a sua parte para estimular o crescimento da utilização de fontes de energia mais sustentáveis: “Sendo conscientes sobre as cadeias envolvidas na produção dos produtos que consomem, evitando comprar de empresas ambientalmente incorretas. E, ainda: Se mobilizando para que as autoridades criem políticas de incentivo e, principalmente, preservando o ecossistema onde vive, denunciando aos órgãos competentes irregularidades e minimizando seus hábitos de consumo de produtos poluentes”.
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