Pela primeira vez em Goiânia, Grupo XIX de teatro apresenta espetáculo inspirado em obra do cineasta italiano Pasolini
O grupo de São Paulo oferecerá duas apresentações gratuitas, além de oficina de Interpretação e Dramaturgia
Goiânia é uma das capitais que vai receber a circulação do espetáculo “Teorema 21”, do Grupo XIX de Teatro, de São Paulo, que vem à capital goiana pela primeira vez. As apresentações acontecem no Museu de Arte de Goiânia nos dias 16 e 17 de agosto, às 16 horas. O espetáculo foi dirigido por Luiz Fernando Marques e a dramaturgia é de Alexandre Dal Farra (indicado ao prêmio APCA em 2014). A peça é inspirada na obra Teorema, do italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975), cineasta, escritor e poeta, considerado um artista visionário e que fazia duras críticas ao consumismo. Em 2015, uma série de homenagens foram feitas pelos 40 anos de sua morte. O projeto de circulação foi selecionado pelo Programa Petrobras Distribuidora de Cultura 2017/2018 e as apresentações são gratuitas.
A trama se passa na casa onde a família morou há alguns anos e agora volta sem nenhum motivo aparente. A montagem é sempre encenada ao entardecer em espaços não convencionais, preferencialmente abandonados ou deteriorados pelo tempo. Ao entrar no espaço e ocupar as cadeiras giratórias dispostas aleatoriamente, o público é inserido no interior da sala de estar e pode girar as cadeiras para escolher o melhor ângulo para cada cena.
“Teorema 21 é uma peça que vem se tornando mais e mais atual. “O público pode esperar uma visão bastante ácida do nosso momento atual e, ao mesmo tempo, encontrar uma forma de teatro bastante contemporânea que trabalha com espaços não-convencionais e presença do espectador no jogo da encenação” comenta Janaína Leite.
Oficinas
O grupo ainda oferecerá oficinas que tem como base a pesquisa que fazem na exploração de espaços não-convencionais, na participação do público e no modo colaborativo de gerar dramaturgia. A proposta é oferecer uma imersão a partir de alguns procedimentos utilizados pelo grupo durante a criação da peça Teorema 21. A oficina será ministrada por Janaina Leite e Luiz Fernando Marques e conta com 30 vagas. Elas acontecem nos dias 13 e 14 de agosto, às 18h na FETEG. Os interessados devem enviar e-mail para [email protected], até dia 10 de agosto. A divulgação dos selecionados será dia 11 de agosto.
A peça
Uma família retorna ao seu antigo lar. Ao buscar encontrar novas possibilidades de existência nesse ambiente antigo, recriam as suas relações e experimentam novas formas de contato. O núcleo familiar é constituído por um patriarca, a mãe, o filho e a filha. Vive na casa, ainda, a criada Emília. Tudo parece estável. Mais do que isso, estagnado. A chegada de um estrangeiro ameaça transformar a estrutura dessa família.
Ao ler o livro de Pasolini, Alexandre Dal Farra se deparou com a questão: Qual seria um possível teorema para os tempos atuais? “Não se trata de pensar sobre as alterações das relações familiares, mas sim, nas mudanças na dinâmica do próprio capital, e na sua relação com a ideologia. O capitalismo ainda precisa de ideologia? Talvez essa seja a questão central da peça, ao meu ver”, explica Dal Farra.
Para Luiz Fernando Marques a peça é a tentativa de falar sobre um mal estar geral que estamos vivendo. “A obra de Pasolini é muito importante, muito presente na peça, é a alegoria da burguesia. Só que no início dos anos 60 essa burguesia estava assentada numa classe e de certa forma representada pela estrutura familiar. Em Teorema 21 é como se essa classe burguesa, ou essa ideologia tivesse se esparramado para todas as classes”, comenta Marques.
O diretor explica como essa engrenagem pode girar em qualquer lugar. “Seja dentro da família, dentro de um partido politico ou até mesmo dentro de um grupo de teatro. O estrangeiro chega para romper com esse sistema, mas a engrenagem se mostra forte o suficiente para se impor perante ele”, comenta. Ao mesmo tempo, isso poderia se passar em qualquer cidade do mundo. “A burguesia é igual em todos os lugares. Temos a sensação de que esse capital mesmo desgastado, em crise não consegue ser desmontado. Ele não se destrói, ele permanece”, comenta o diretor sobre a atualidade da peça. “O nosso Teorema olha para o horror do nosso tempo, o fascismo em Ascenção mas encara que as nossas principais forças revolucionárias também seguem sendo tragadas, capitalizadas pelo poder.
Teorema 21, parte ainda de outras referências como os filmes Dente Canino (Giorgos Lanthimos, 2009), Funny Games (Michael Haneke, 1997) e o Saló (1975), do próprio Pasolini. Saló foi o último e um dos seus mais polêmicos filmes. Numa entrevista publicada seis dias após seu assassinato, Pasolini disse ao jornalista: “Pretendo que você olhe em torno e se dê conta da tragédia. Qual é a tragédia? A tragédia é que não existem mais seres humanos, existem estranhas máquinas que se batem umas contra as outras”.
Processo colaborativo
Teorema 21 é resultado de um trabalho colaborativo que contou com contribuições diferentes do diretor Luiz Fernando Marques, de Alexandre Dal Farra e dos atores. “Trabalhamos juntos desde o inicio do projeto, com revisões no texto, mudanças, experimentação das cenas. A escrita e o olhar do Alexandre me interessam muito. Ele entende a dinâmica do Grupo XIX, até por fazer parte de um grupo também, e tem se revelado um parceiro importante. Trabalhamos de maneira muito orgânica. Destaco também o envolvimento no trabalho dos atores, que além da participação no processo exercem outras funções como a criação dos figurinos de Juliana Sanches e o cenário de Rodolfo Amorim”, explica o diretor Marques.
Teorema estreou no cinema, em 1968 e ganhou uma versão literária, escrita pelo próprio Pasolini, no mesmo ano. Por meio de suas personagens, o autor critica a futilidade, o comodismo e a alienação da burguesia. O livro recria a obra estilisticamente, a partir do que é característico a cada linguagem. Se o filme é quase sem palavras, o livro descreve a exaustão a simbologia que se expressa na relação entre as personagens.
“Convidamos o dramaturgo Alexandre Dal Farra para analisar os recursos narrativos que são diferentemente empregados no livro e no filme homônimo, levantando hipóteses para um possível recorte, agora, no teatro. Não se trata de uma adaptação, mas de uma recriação da obra citada com texto inédito”, explica Luiz Fernando Marques.
Sobre Pasolini
Pasolini entrou tardiamente para o cinema, tendo sido a literatura e a poesia seu canal de expressão da realidade por muitos anos. Menos conhecida ainda é sua obra teatral. É considerado um pioneiro, um autor multimídia, e o cineasta italiano mais estudado, mesmo antes de sua morte.
Homossexual, foi brutalmente assassinado em novembro de 1975. O processo judicial concluiu que foi morto por um garoto de programa, porém essa versão é contestada até hoje. Pasolini morreu um dia depois de voltar de Estocolmo, onde havia se reunido com Ingmar Bergman e outros representantes da vanguarda cinematográfica sueca, e de ter dado uma entrevista à revista L'Espresso com declarações polêmicas sobre tema favorito: "Considero o consumismo como uma forma de fascismo pior que a versão clássica".
Sobre o Grupo XIX de Teatro
O grupo XIX de teatro tem um trabalho contínuo de 14 anos, com pesquisa temática voltada para a história brasileira, uma pesquisa estética de exploração de prédios históricos como espaços cênicos e uma investigação sobre a participação ativa do público. O grupo montou 6 espetáculos com dramaturgia inédita – todos em repertório até hoje - Hysteria, Hygiene, Arrufos, Marcha para Zenturo (em parceria com o Grupo Espanca), Nada aconteceu, Tudo Acontece, Tudo Está Acontecendo, Estrada do Sul (em parceria com o Teatro dell’argine, da Itália) e o mais recente trabalho é o primeiro espetáculo dedicado ao público infantil, Hoje o escuro vai atrasar para que possamos conversar.
Desde 2004, o grupo realiza residência artística, na tombada Vila Operária Maria Zélia, no Belém, em São Paulo. Em 2005 o grupo foi indicado ao Prêmio Shell de Teatro na categoria especial pela intervenção artística na Vila Maria Zélia. Ao longo de sua trajetória o grupo acumula entre prêmios e indicações mais de 15 menções nos principais prêmios do país: Shell, APCA, Cooperativa Paulista de Teatro, Bravo!, Qualidade Brasil entre outros.
O grupo também tem uma relevante trajetória internacional, realizando as suas peças não só na língua portuguesa como também em francês, inglês e italiano. O grupo já percorreu no exterior 21 cidades em 5 países (Europa: Portugal,
Inglaterra, Itália e França; África: Cabo Verde e México: Cidade do México). No primeiro semestre de 2005, o grupo cumpriu uma temporada de dois meses de Hysteria por 8 cidades francesas por ocasião do “L’année du Brésil en France”. Em junho de 2008 a peça cumpriu temporada no renomado Barbican Center de Londres na Inglaterra e, em 2009 o grupo foi convidado pelo Contact de Manchester para dirigir o espetáculo de formatura da instituição.
Em 2012, o Grupo participou da mostra São Palco, idealizada pelo O Teatrão, em Coimbra, Portugal e participou do Festival La scenna dell’incontro, em Bologna, Itália em parceria com o ITC e o Teatro dell’Arginne. Em 2013 o grupo participou do Ano do Brasil em Portugal por 5 cidades.
As longas temporadas das peças do Grupo XIX colocaram sua sede na Vila Maria Zélia(SP) no mapa Cultural Brasileiro. Prova maior disso é que hoje outros coletivos, inclusive de outras cidades, também cumprem suas temporadas no local. Este movimento tem impulsionado ainda mais um outro importante projeto do grupo: Os Núcleos de Pesquisa.
Os Núcleos são coletivos formados a partir de seleções que já chegaram a atingir o número de 400 inscritos, que ao longo do ano, sob a orientação dos artistas do grupo XIX de teatro, desenvolvem diversas pesquisas nas áreas de atuação, direção, dramaturgia, corpo e direção de arte. No total mais de 1000 artistas já participaram destas atividades e delas têm surgido novos coletivos teatrais de destaque como o Teatro da Travessia, Teatro do Fubá, dentre outros.
Ficha técnica:
Realização Grupo XIX de Teatro. Dramaturgia Alexandre Dal Farra. Direção Luiz Fernando Marques. Dramaturgismo Janaina Leite. Atuação Janaina Leite, Juliana Sanches, Bruna Betito, Paulo Celestino, Rodolfo Amorim e Ronaldo Serruya. Produção Executiva Cristiani Zonzini e Andréa Marques. Cenografia Luiz Fernando Marques e Rodolfo Amorim. Figurinos Juliana Sanches. Vídeo Luiz Fernando Marques Preparação Corporal (parkour) Diogo Granato. Assistência de Figurino e adereços Gabriela Costa. Provocadores do processo Eleonora Fabião, Marcelo Caetano, Miwa Yanagizawa, Luis Fuganti e Bruno Jorge. Participação no processo Mariza Junqueira. Arte Gráfica, fotos e mídias Sociais Jonatas Marques. Produção local Gisele Carvalho.
Serviço: Grupo XIX de teatro apresenta espetáculo Teorema XXI e oferece oficinas em Goiânia
Espetáculo
Local: Museu de Arte de Goiânia, Rua 1, número 65, Bosque dos Buritis, Setor Oeste
Datas: 16 e 17 de agosto
Horário: 16 horas
Entrada franca
Assessoria de imprensa: Nádia Junqueira 61 9 8281 0759 –
[email protected]
Oficinas
Local: Federação do Teatro de Goiás, Rua 88, 65, Setor Sul
Datas: 13 e 14 de agosto
Horário: 18 horas
Nádia Junqueira Ribeiro